sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Embora

Ela foi embora. Embora devesse ficar. Foi embora, embora seu coração dissesse “fique”. Foi embora daquela cidade. Embora a amasse tanto. É só que, embora tudo lá ainda a fizesse lembrar dele, embora ela se foi. Embora seja tarde demais, ela já se fora. Não há voltas quando se vai embora. Embora devesse haver.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Quem sabe?

Eu achava que nada nunca ia mudar, que as coisas iam continuar daquele jeito. E eu odiava isso. E as coisas acabaram mudando, e eu nem percebi. De repente a gente já não faz as mesmas coisas, a gente já não se sente do mesmo jeito. E amanhã pode estar tudo renovado. Acho isso o maior barato, você dormir sem saber se vai ter mudado de ideia amanhã. Se vai acordar querendo outras coisas, ouvindo outras músicas, vestindo outras roupas. E quem sabe, daqui a três anos, você não olhe pra trás e sinta falta das músicas que ouve hoje, das roupas que veste hoje, de querer o que quer hoje.
                Mas não é pra você ficar chateado não. Imagina se você quisesse as mesmas coisas, fizesse as mesmas coisas, e tudo fosse do mesmo jeito, pra sempre. Eu prefiro ficar mudando assim, sem perceber, e ter coisas das quais eu possa me lembrar feliz daqui há três anos. E dizer: “Como era bom naquela época! What’s next?”

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Feito-para-corações-partidos

Mas ela não queria se identificar com nenhum desses textos feitos-para-corações-partidos que lia. Queria lê-los e simplesmente pensar: “não sei do que se trata. Nunca amei demais, nunca quis demais, nunca esperei demais de ninguém. Nunca amei errado. Graças à Deus, não preciso cuidar do meu coração. E se vir mais um desses textos pela frente, vou ter vontade de vomitar. Falo sério. Não sei o que esses textos me dizem. Simplesmente não me identifico.”
                E depois desse pensamento, riu de si mesma. Quando crescesse queria ser exatamente assim. Não se identificar. Se identificar é bom, porque você acha que outros te entendem. E é ruim, porque você vê que também tem muita gente com o mesmo problema que o seu. Vários corações partidos vagando por aí. Esperando por um texto feito-para-corações-partidos para se apoiar.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Os desejos de amanhã

E à partir daquele momento, nas horas finais do ano, soube: sempre acabaria no chão da cozinha, comendo qualquer coisa sem estar realmente com fome, vestindo roupas sujas e cheirando a cigarro. E então pensou: Cá estou novamente, sentada aqui, assim como no ano passado, e no ano anterior, e no anterior... Durante o ano, vejo coisas diferentes, sinto coisas novas, presencio momentos mágicos, e no final, sempre me vejo aqui. À perguntar ao chão da cozinha qual seria meu novo sonho. Qual será minha vontade quando acordar amanhã. Talvez viajar, fazer um curso, sentir o vento no rosto, suspirar. Ou talvez todos esses. Uma garota pode sonhar, não pode? E realizar seus sonhos, será que pode?
          Confesso que morro de medo desse(s) desejo(s) de amanhã. Já quis coisas desesperadamente, e no final, não era bem assim. Acabei no chão da cozinha reclamando de um dia ter desejado aquilo. Será que o que seja lá que eu vá desejar amanhã, vai me prejudicar mais tarde? Pensando bem, poucos os meus desejos de amanhã não me decepcionaram. A maioria deles me mostrou aquela coisa do ‘cuidado com o que você quer porque pode conseguir’. Eu quero conseguir e não me preocupar em ter cuidado. Ou será que meus desejos serão sempre tão errados?
          Isso, eu só vou descobrir, se eu tentar realizá-los. E é isso que me motiva a levantar do chão da cozinha e encarar mais um ano. Meus desejos de amanhã.

domingo, 16 de janeiro de 2011

Entre

Poderia ficar ali, entre o chão empoeirado da cozinha e o teto que agora parecia baixo demais. Beberia entre duas ou três taças de vinho antigo que restara no armário, ouviria aquela canção entre quatro e cinco vezes, até a vitrola não aguentar mais, pra ter certeza de que aquela história não fora fruto de sua imaginação. Não fora, não poderia ser. Ela pairava entre a consciência e a imaginação. Entre seu vestido de bolinhas e o chão, um cigarro entre os dedos, entre um gole ou outro, um acorde ou vários, pensava: como eu vim parar aqui? Entre a verdade e a mentira. Entre tantas coisas que agora desconheço. Sempre entre, nunca antes, nunca depois. Entre.

domingo, 2 de janeiro de 2011

Incerteza

É a única coisa que tenho certeza, aliás: da incerteza. Sou mais incerta do que pareço. O único quadro no qual minha incerteza desaparece é nesse: nada é certo. Nada é pra sempre. Tudo muda. Querendo ou não, ainda tem muita vida lá na frente.
Só não me pergunte sobre outras coisas. O que quero ser, o que quero comer, onde quero estudar, como vou me virar. Não sei, não sei, não sei.
E porque essa incerteza toda, não sei também.