sábado, 21 de julho de 2012

tudo que cabe no silêncio


Nunca me senti tão próxima e tão íntima do meu pai como quando nessas duas vezes: uma num ano novo em Copacabana que só nós dois percebemos o quanto vazios estávamos de ver os fogos estourando, as pessoas se abraçando, e nossos olhos transbordando. Aquela sensação de vazio, de "eu não fiz tudo que queria", e a pior de todas: "tá faltando alguma coisa". A gente só conseguiu se abraçar e chorar de novo baixinho, pra ver se passava, mas acho que vazio com vazio não preenche buraco nenhum. A segunda vez foi quando Amy Winehouse morreu, a nossa Amy. Aquela voz. Aquele cabelo. Aquele bom humor. Eu liguei pra ele e a gente não precisou falar nada, que nem no ano novo. Na verdade, nessas horas a gente não precisa falar muito pra entender, se não chegar ao ponto de não precisarmos falar nada. A gente só chorava. Amor é um jogo perdido, Amy. É, sim. Mas a gente joga. A gente se enche de vazio, a gente se enche de esperanças perdidas, e a gente se achava na sua música. 
Eu não sabia o que ele queria quando deu meia-noite, pelo quê ele chorava. Será que ele sabia que isso tudo ia acontecer? Que hoje estaríamos aqui, não tão felizes ou não felizes por completo, mas seguindo em frente? Será que a gente sabia? A gente sentia?
A gente não é de se abrir, de se contar um pro outro, porque as outras pessoas já exigem da gente demais. Exigem palavras, explicações. Coisas que nem sempre a gente tem pra dar. Isso eu puxei dele. Então todo mundo diz “vai conversar com o seu pai” quando ele tá triste e eu digo “ok”, mas eu na verdade só vou sentar do lado dele e ficar lá. Sem falar. Sem exigir. Sem cansar. Todo mundo merece ter seu momento de tristeza sossegado, quieto, sem muita confusão, gritando a sete mares. E a gente sabe bem disso, eu e ele. A gente conversa de outra forma. A gente se entende de se olhar. E tá tudo bem. 
A gente sabia que a gente não precisa se desesperar mas não dá, somos elétricos demais, e a vida gosta de dar susto na gente. Muitos sustos. 
Se tem uma coisa que eu aprendi com ele sem ele nunca ter tentado me ensinar, é: não fala nada. Dê o espaço que as pessoas precisarem. Às vezes no silêncio a gente encontra mais conforto. A gente sabe de tudo que precisa saber e ninguém precisa repetir. Nós somos dois teimosos e nada que ninguém vá falar vai entrar na nossa cabeça. Todo mundo reclama. Mas a gente só entende quando a gente chega a uma conclusão por nós mesmos. Ainda que essa conclusão seja a mesma que todo mundo tenha tentado enfiar garganta à baixo antes. 
A gente sabe muito bem.
A gente fica quietinho.
Chora baixinho.
Ser triste
Estar triste
É sagrado
É coisa sua
Não vamos falar nada.
E entender tudo.
Isso eu aprendi com o meu pai. E ele nunca falou nada disso pra mim.

Um comentário:

  1. A gente aprende muito com gestos e atitudes,né? palavras nem sempre sao tudo..

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